Vejo todos os dias manifestações sobre o direito das pessoas com necessidades especiais, programas sobre pessoas que são abandonadas em asilos ou hospitais por serem dependentes devido à sequelas de acidentes ou problemas congênitos, enfim, que de alguma maneira ou outra precisam ou de reeducação para conviver na sociedade ou de atenção cotidiana ou especial. Popularmente, chamamos essas pessoas de deficientes ou mentais ou físicos, quando não os dois juntos. Ontem à noite, ao ver algum desses programas, desejei que se tiver filhos eles sejam saudáveis, para que possam viver bem quando eu me for. Mas questionei, ao mesmo tempo, o que é, realmente, ser privado de suas habilidades motoras, físicas ou mentais? O que é realmente ter capacidade de viver dependendo apenas de você? O que é ser cego, surdo, mudo, desprovido de movimentos e de capacidade de análise? O que é, de verdade, estar no mundo plenamente? Quem de nós pode dizer que faz bom uso de seus sentidos?
Já pensava que a humanidade corre tanto para conseguir dinheiro na ânsia de adquirir coisas às quais não tem necessidade real que simplesmente não aprecia a vida que transcorre todos os dias. Mas meu raciocínio mostrou que é bem pior que isso, confesso que tive um choque de realidade, essa mesma realidade que você não vê. Os verdadeiros deficientes somos nós, os que tem todas as capacidades físicas e mentais e as subutilizamos ou nem valorizamos. Percebi que as pessoas não enxergam, cegas que estão por apelos consumistas e a competição no mercado de trabalho, deixam de observar os pássaros voando, a grama crescendo ou os estragos que a humanidade faz ao planeta (alienação? quem são os verdadeiros alienados?). Os Cegos que enxergam não vêem a vida transcorrendo, os filhos crescendo e os vazios que carregam no peito; não vêem as desigualdades no mundo, a beleza de um amanhecer ou a poesia no crepúsculo; não enxergam que o tempo está passando. Não contemplam o mar como um gigante misterioso e nem admiram a vida em todas as suas manifestações, não leem nos olhos de alguém o amor que essa pessoa tem por ele. Triste.
Os Surdos que ouvem jamais atentam para o canto de um pássaro em sua janela ou a gargalhada mágica de uma criança; escutam os apelos do tráfego mas não o lamento de seus familiares ou amigos; não ouvem os sussurros do mundo; apenas o tic-tac do relógio ou o chamado do dinheiro. Jamais deixam a música entrar em seu coração e alegrar sua vida; jamais escutam o que está além das palavras e nem percebem o real significado destas ou as entonações de voz que denunciam a sinceridade ou a falsa intenção. Triste aqueles que não ouvem sua intuição ou a voz do seu coração, que passam pelas pessoas sem nem ao menos escutar por alguns momentos a história que tem para contar, que vedam seus ouvidos aos chamados do espírito. E emudecem quando eu ou você mais precisamos ouvir um alento, uma palavra de amor e carinho ou a simples declaração de afeto que está mais nos olhos que nas palavras, a linguagem do coração. E o que escrever sobre o Olfato, que não cheira o doce perfume que vem das flores, a harmoniosa combinação de chuva e grama, o chamado aéreo de uma comida bem feita, como uma brisa de sabores. E o Paladar, esse esquecido, que come mais do que precisa sem saborear as combinações de temperos e que se farta e promove a gula como se fosse melhor do que a deliciosa promessa de um sushi com um toque de raiz forte e embebido em shoyo, que não degusta um risoto delicioso devagar, sem pressa, como um amante desvenda o corpo da amada. Triste.
O Tato esquece do contato quente de um abraço, tão preocupadas que estão as mãos em carregar sacolas de compras, em segurar o volante em intermináveis horas no trânsito, em conversas ao telefone ou no bate-papo de alguma rede social. Mas e o toque de quem se ama, se deseja, daquela pessoa que lê nossa alma com um simples olhar, acalentando nosso dia? E as mãos perdidas no corpo dO alguém, queimando indefinidamente a pele e promovendo labaredas de desejo e amor? E os afagos em uma criança, que brinca e pula em nossa volta? Realmente, perde-se tanto ao não se praticar pequenas atitudes.
Somos aptos para caminhar, correr e nos movimentar, mas não usamos nossa energia de maneira produtiva, somos sedentários, entramos em elevadores e caminhamos até nossos automóveis ou ônibus, mas não andamos calmamente por um parque movimentando nossos músculos, fazemos mal à nossa coluna por horas e horas sentados ou mal posicionados, o que seria facilmente resolvido ou prevenido se houvesse o hábito de exercitar-se. Quem é, afinal, o deficiente físico? Alguém, por favor, responda em silêncio. Não é uma resposta fácil de ser dada e de pior constatação. Eu vejo a modernidade produzindo zumbis vivos, a comida não é combustível, vive-se para comer. Não sentimos de verdade, economizamos energia e vontade, economizamos afeto e abraços, economizamos vida e desperdiçamos tempo.
Eu gosto da vida moderna, lógico, mas acredito que nos conectamos ao mundo através dos computadores, mas não conectamos à Natureza nossos sentidos e nosso corpo, não conectamos nossos corações às pessoas por quem temos nosso apreço, vivemos reclusos em cavernas reais ou imaginárias com medo de sentir, provar, viver. Me pergunto, por quê vivemos, eu e você? Qual a finalidade de uma máquina orgânica perfeita, que não usa adequadamente suas habilidades? Sei apenas que decidi usar bem minha máquina. Decidi fazer com que meu coração sinta, meu corpo se movimente e meu cérebro pense. Decidi por mim, por viver. E você?
Eu gosto da vida moderna, lógico, mas acredito que nos conectamos ao mundo através dos computadores, mas não conectamos à Natureza nossos sentidos e nosso corpo, não conectamos nossos corações às pessoas por quem temos nosso apreço, vivemos reclusos em cavernas reais ou imaginárias com medo de sentir, provar, viver. Me pergunto, por quê vivemos, eu e você? Qual a finalidade de uma máquina orgânica perfeita, que não usa adequadamente suas habilidades? Sei apenas que decidi usar bem minha máquina. Decidi fazer com que meu coração sinta, meu corpo se movimente e meu cérebro pense. Decidi por mim, por viver. E você?
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