Pular para o conteúdo principal

A neurose de amor

 
 
Um famoso escritor da atualidade, volta e meia desopila seus amores e desamores em suas crônicas em jornais e no mundo virtual. Posta fotos de suas amadas, fala de seus sentimentos e, na minha opinião, expõe exageradamente aquelas que diz amar. Ele é ele, lógico, marketing ou não, é a sua maneira de expressar sentimentos. Tem vários casamentos e relações nas costas, todos definitivos, todos exagerados, todos propagados e difundidos. Sofre e se arrebenta em textos, pede para que ela volte, desfia as qualidades da amada, enaltece a relação, desabafa sobre o rompimento. Dali a algumas semanas, outra musa sobe ao posto, com tanta intensidade quanto a anterior. Essas atitudes, em minha modesta opinião, demonstram uma situação: ele ama mais o amor do que a pessoa e sufoca quem está com ele.

Você o criticaria, amiga(o), diria que é um cara impulsivo, chato e tal. Entretanto, quantas vezes você amou o amor, se apaixonou pela relação e não pela pessoa? Quantas vezes evitou de admitir erros seus ou do outro? Quando se ama, se admite erros, defeitos e mágoas. Quando se ama, não se ama de pronto, se ama aos poucos, se desvenda alguém. Amar de pronto é paixão, cegueira, euforia, é ver no outro a si mesmo e não quem o outro é, suas complexidades. O amor precisa de tempo, de dedicação e, lógico, vontade. Ficar na vida de alguém não é fácil, compreensão, respeito e sincronia são essenciais. Sufocar o outro com um sentimento irreal e desmedido é impor sua presença na vida de alguém. Acredito que o problema do tal escritor é justamente buscar no outro um sentimento que não existe, uma completude desnecessária. Talvez, apenas talvez, seja tão arrogante que ama a si mesmo quando tem alguém e não consegue se amar sendo sozinho. Talvez não suporte a própria companhia e precise de muletas para justificar a existência.

Já me apaixonei pela ideia e não pela pessoa, já tive paixões ensandecidas, já tentei gostar, já me senti miserável e já fui arrogante, mas aprendi que me amar acima de todos é muito, muito melhor. Preciso até controlar meus hábitos para não ser excessivamente individualista, fazendo tudo ao meu modo. Mas convivo bem comigo e quando abro a porta da minha vida não é porque precise da pessoa, mas porque quero que esteja aqui, me desvendando e compartilhando seus hábitos e sonhos. Quero desfolhar indefinidamente as variadas camadas e facetas, quero saber suas motivações, sonhos medos e dramas. Quero conhecer sua história, saber de que material foi forjado, sentir ciúme e afeto. Quero me perder nas pupilas dele e decifrar cada gesto. Pretender amor e não respeitar a individualidade do outro é egoísmo, arrogância, se acreditar tão insubstituível e necessário que a outra pessoa nem precisa debater a relação, como se dependesse de você ao ponto de não ficar longe. Bobagem.
 
Amor é dor que faz crescer, é maluco e até simples. Desde que você aceite que amor real e palpável nunca faz mal e amor dado é respeito, compreensão e silêncio ao ser amado. Amor não é vício. Mas nunca, nunca mesmo, confunda amor com idolatria. Nem que seja a idolatria ao seu próprio sentimento, como parece fazer o dito escritor. E lembre-se, melhor que amor nenhum é o amor-próprio.

Comentários

Postar um comentário

Obrigada.

Postagens mais visitadas deste blog

Eu em mim

Eu estive aqui ontem. Hoje, sou outra a surgir. Eu estive aqui há um mês. Hoje, não quis voltar a dormir. Eu estive lá há um ano. Voltei agora e eu não sou o mesmo lugar. Eu me apaixonei há quatorze meses. Hoje, sou outra e não amo. Eu amei profundamente há três anos. Hoje, lembro com um afeto intenso, mas é outro o coração que pulsa. Eu me namoro hoje. Há oito meses queria morrer. Não sou a mesma em mim, mas somos as mesmas em processo de mudança. A Claudia melancólica, a Claudia fechada, a Claudia vibrante, a Claudia sombria, a Claudia falante. A Claudia quieta. A Claudia poeta. A Claudia que é a água de um rio, o sopro do vento, a chama da vela e a floreira da orquídea. A Claudia que me habita e a quem amo muito. A desesperança e o desânimo são intangíveis e impermanentes.  Meu amor por mim é árvore, que cresce um pouco todos os dias. Sou eu em mim, na mudança do hoje e do amanhã.

Manual da TPM para homens

Caro Homem Moderno, você precisa de umas dicas para sobreviver à nossa TPM. Sabemos que, para você, é uma verdadeira odisseia passar seus dias e noites com uma mulher que oscila de humor e atitude ao menos uma vez por mês. A primeira delas é: tenha juízo e caia fora. Mantenha distância absoluta, ainda mais se você não for o tipo de cara que sabe lidar com diferenças. Já entendi que você ignorou meu primeiro conselho, então, não reclame. Deixou de lado o bom senso e permaneceu por perto de uma mulher em TPM. Apesar do meu aviso, resolveu ficar ali, cuidando e acariciando sua linda amostra do Apocalipse. Para que você consiga passar indefinidamente por esse período com o mínimo de danos, recomendarei algumas atitudes muito salutares (ao menos para você). Entenda o princípio  de tudo. Sofremos todos os meses um bombardeio hormonal a fim de ovularmos e, posteriormente, menstruar. Não é fácil a tempestade emocional de uma mulher, afora os eventuais desconfortos físicos, como cól

Meio ogra, inteira sua

Poderia me descrever de várias maneiras, exaltar minhas qualidades e fazer você acreditar que sou a Branca de Neve esperando pelo seu príncipe, o que não é verdade. Para começar, digo a você que sou meio ogra, grossa e desastrada, que ando avoadamente nas ruas e, algumas vezes, quase fui atropelada. Posso comentar, inclusive, sobre minhas TPMs ferozes e que não saberá se chorarei ou terei raiva de alguma situação. Mulher-Iceberg, tenho um coração que se derrete mas que também congela. Impulsiva quando o sangue ferve, quando resfria vem a calma e o arrependimento. Não pergunte o que sinto, perceba quem sou. Observe minhas janelas verdes e saberá cada nuance das minhas emoções e onde escondo os sentimentos, siga meus passos e descobrirá a caverna escura onde me escondo. Posso afirmar que gosto de gente, mas adoro ficar sozinha. Gosto de cuidar dos outros, mas preciso e muito que cuide de mim. Não uso biquíni, não viu à praia, não gosto de areia e não me bronzeio, embora, mo