
Eu tenho
verdadeira vontade de enfiar no vaso sanitário na cabeça de alguém que chama
minha cidade muito amada de buraco. Ou que diz que essa cidade é um túmulo, que
não há nada para fazer, que não tem futuro. Que o povo é provinciano. Pois é,
para aquelas vidas roubadas tão cedo, o futuro como o idealizamos não vai
chegar. E o túmulo se espalhou. Mas o mais engraçado é ver quem tanto desfez
exclamar que tem orgulho daqui. Eu sempre tive, não preciso ver o horror de
perto para saber que essa gente é louca de especial, buena na essência e no
verso. Gente que conversa com o vizinho, que vai ao Parque Itaimbé tomar um
chimarrão, que gosta de passear na UFSM depois de formado. Gente que pode até
parar em frente de alguma Igreja para ficar na espreita de algum casamento
alheio (já fiz isso, queria ver o vestido da noiva). Mas é gente que pensa,
inteligente, sagaz, feliz. Gente que se irrita com a ainda predominante
mentalidade empresarial antiquada, mas que sopra ventos novos para um futuro
diferente.
Eu acredito
em um futuro relevante para nós, eu acredito realmente que podemos mudar a
maneira como somos vistos, porque precisamos nos ver diferente. Essa cidade tem
gente muito bonita, por dentro e por fora, tem gente que acorda cedo, que
reclama do trânsito, que namora, que chora. E gente que deu o exemplo para um
país inteiro de como podemos ser solidários e engajados, de como estendemos a
mão e como nosso coração chora, mas também se compadece da dor alheia. Minha
cidade surgiu de um acampamento militar, deve explicar porque podemos organizar
rapidamente uma manifestação pacífica e linda tão rapidamente. De como podemos
nos entristecer, mas nos indignar com o que consideramos errado. E que nunca,
mas nunca mesmo, essa indignação esmoreça. Rezar sim, mas nem Gandhi ficou em
casa ou no templo entoando mantras o tempo todo. Agir sempre, exercer nosso
direito de cidadão que vota e de consumidor que frequenta locais públicos para
comer, dançar, se distrair.
Então, para
você que chamou essa cidade de buraco e que hoje estufa o peito, morda a
língua. Se morasse em outro lugar não encontraria essa veia pulsante da
solidariedade. Quem foi embora sempre diz que seus verdadeiros amigos são os
daqui, que outros lugares podem até ter mais diversão, mas aqui tem calor
humano. Mesmo quem nos chama de metidos e arrogantes está, veladamente, nos
admirando. Tanta gente bonita e inteligente só pode causar espanto. Quantos
forasteiros aqui fincaram raízes, tiveram filhos, adotaram um cusco (cachorro)
da rua e compraram uma casa. Quantos fora ao supermercado comprar a carne para
o churrasco que serviram à família adotada de algum amigo. Não se queixe, tenha
orgulho. Estufe o peito e diga que é de
Santa Maria, que tem orgulho desse chão, das ruas que sobem e descem. E nunca
mais fale em minha frente que aqui é um buraco, meu amigo ou amiga. Se o fizer,
dou uns cascudos.
Publicado originalmente em www.aenergy.com.br
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