A era da informação, a era da comunicação, a era em que o passado denominava futuro e se preparava para, com fortes exercícios de imaginação, antecipar o que vivemos. Apenas não se previu as consequências funestas de um mundo onde não sabemos o nome do vizinho, mas seguimos ou adicionamos absolutos estranhos nas redes sociais. Sabemos o que um parente distante está almoçando, mal prestamos atenção em nossa própria comida. Declaramos afeição virtualmente, mas não abraçamos nossos pais. Uma relação só existe se está marcada nas redes com mudança de status de relacionamento e declarações de amor, mas mal sabemos o que nosso parceiro realmente pensa ou sente. Não abraçamos a quem amamos, mas mandamos abraços aos amigos, tudo virtualmente. O amor (e a vida) nunca foi tão volátil e nebuloso.
A irritação que isso me causa (graças que outras inúmeras pessoas partilham o mesmo sentimento) é enorme. É uma chatice não ouvir a voz de uma pessoa, tão impessoal e absurdo, parece até que não existe ou não acontece a comunicação. Ainda prefiro ouvir a voz e trocar uma ideia in loco do que as truncadas conversas via bate-papo. O raciocínio não se completa, dissipa. A expressão "amor líquido" é por demais propícia, Bauman acertou ao descrever nossa sociedade. Se conhece, conversa e ama pelas redes virtuais. A era do exibicionismo, das aparências, da profundidade de um pires; a era em que se importar com alguém é demais. A era em que um abraço é esquecido. A era em que viver se dissolve. Existimos se estamos conectados através do computador, conectar-se pessoalmente é raro.
É errado se revoltar com isso? Eu me revolto, tão fácil ser virtual, muito difícil se apresentar realmente para alguém. Amizades podem começar pelas redes, mas o que as mantém é a troca real de afeto. Relações iniciam, andam e terminam pelas redes. Rapidamente, somos substituídos. Pessoas carentes adicionam alguém indiscriminadamente, algumas até são comprometidas, mais fácil a aproximação virtual, o sexo imaginário do que a real e nem sempre perfeita, mas geralmente ótima, troca de experiências reais, de ouvir o som da risada in loco, de estar realmente perto e próximo. Enxergar é mais do que simplesmente ver, tocar é mais do que um exercício da libido. Curtir todo e qualquer post na tentativa de chamar a atenção (eu curto várias postagens de páginas, mas pessoas eu boicoto, na maioria das vezes, hehehe), chamar para o bate-papo, conversar besteiras ou algo sério, tudo em nome de atenção, qualquer que seja.
O mundo é tão cercado de medo, que as relações construídas virtualmente são seguras. Não há riscos, emocionalmente. Você se expõe, mas pensa que é relativo. Seu coração está ali, guardado em algum lugar em que nem lembra, mas tecla sobre ele nos murais, nos comentários, em tudo. Sei, também faço isso, a diferença é que escrevo textos, alguns dedicados a alguém, outros inspirados por conversas ou observações. Confesso que não tenho muita paciência para teclar e teclar, um momento começo a me irritar e mais e mais arrumo uma desculpa curta e até grossa para cortar o assunto. Minha vontade de pele, voz e calor humano é imensa.
Obviamente, bem aproveitadas, as redes sociais tem seu valor. As conversas por vídeo podem aproximar casais e parentes que estão longe, ligações telefônicas e mensagens de voz ajudam um pouco. O lado oposto da virtualidade é que, conhecer alguém por esses meios, pode ser uma cilada. Dificilmente a pessoa mostra quem realmente é ou não percebemos detalhes importantes. Há os carentes profissionais, que atiram a rodo seus dardos na expectativa de alguém lhes dar atenção, há os aproveitadores, os predadores sexuais, pessoas carentes, problemáticas e com ingredientes obscuros que é preciso observar bem para captar. De qualquer maneira, são pessoas nebulosas e que, em circunstâncias normais, provavelmente manteríamos distância.
Talvez seja essa a Matrix, um lugar virtual e ilusório onde todos coexistem, mas não vivem, traçam personalidades, gostos e perfis aos quais não são exatos. Onde criamos a vida que queremos, com fotos bonitas e cuidadosamente escolhidas, com amores montados, com farsas vividas. Não estamos mais próximos, nem juntos e nem mais felizes. Não somos mais amados ou compreendidos, somos julgados e julgamos, somos esquecidos e esquecemos. Essa pluralidade virtual tem um lado bom, óbvio, entretanto, percebo que poucos o exploram. Fiz uma grande amiga virtual, é minha amiga ao ponto de perceber quando estou bem ou mal. Tenho acesso a periódicos que não são comuns na minha cidade, mas pesquisei sobre eles e os encontrei. Descobri uma vocação adormecida, li sobre assuntos diversos, tive acesso a livros e filmes. Fiz companhia a amigas que estavam solitárias e tive companhia também. Separar o joio do trigo se faz necessário, mas urgente mesmo é repensar esse grande teatro de costumes que é cada rede social.
Por isso, é importante repensar nosso papel nesse mundo em que vivemos, onde tudo é facilmente substituído e a vida não é contemplada e realmente vivida. Sentimentos são superficiais, assim como as pessoas. Um homem pode conversar com você e ser acessível e afetivo ao mesmo tempo em que o é com outra e vice-versa. Sua namorada pode declarar amor nas redes, mas fazer sexo virtual com estranhos ou até com seu melhor amigo. É preciso com urgência haver um posicionamento pessoal meu, seu, nosso sobre tudo isso. Esse é o lado oposto de quem não está junto nem real, nem virtualmente.
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